O silêncio e o ouro - Parte I
Data Original: 2005-08-24
Um dos pontos mais importantes para assegurar a estabilidade de uma relação é a gestão de conflitos. Afinal, quando tudo corre bem, nada parece correr mal, mas quando alguma coisa corre mal, é sinal que nem tudo corre bem. Sim, eu sei. Eu também fiquei espantado com as minhas geniais capacidades de dedução quando reli esta frase, depois de a escrever. Se eu conseguisse aplicar essas capacidades de dedução ao IRS, seria muito mais... muito mais... enfim, muito mais, que é o que interessa.
Bem, adiante... os conflitos são inevitáveis, mas, dependendo da forma como lidamos com eles, os seus resultados podem ser muito variados. Até agora, tomei contacto com três métodos para levar a cabo esta gestão de conflitos. Hoje apresentarei dois, e no próximo post apresentarei o terceiro.
1. Here & Now
Este método, apesar do nome, não implica que os diferendos sejam discutidos no exacto momento em que surgem. Pode não ser apropriado, p.ex., um casal discutir as suas opiniões divergentes sobre o melhor método de eliminar maus cheiros na casa de banho, durante um almoço de família onde se celebra o 95º aniversário da avó Prudência.
No entanto, este método obriga sempre a que um assunto seja discutido, no máximo, poucos dias depois de ter acontecido. Poderia dizer que é desejável que a discussão seja civilizada, mas o conceito de "civilizado" é tão lato que é melhor nem falar disso.
Direi apenas que este método funciona melhor quando, pelo menos, um dos elementos do casal consegue manter a sua participação na discussão de forma relativamente calma, mesmo que a outra pessoa esteja a começar a atingir tons alarmantes de púrpura, e a partir a colecção de cristais da Boémia apenas com a potência dos seus gritos.
Apesar de este me parecer ser o melhor método, é muito pouco utilizado, e não consigo perceber porquê. Até mesmo eu, que defendo a sua utilização com unhas e dentes, sou culpado de o utilizar de forma inconsistente. Gostava de ter uma resposta brilhante e inovadora para isto. Que raio, já me satisfazia com uma resposta parva e óbvia, desde que fizesse sentido. Se tiverem algo a dizer sobre o assunto, desde que não seja o habitual "as pessoas são assim", feel free to drop me a note.
1.1. Vantagens:
- Dá resultados mais cedo. As incompatibilidades emergem mais rapidamente, e isso permite que seja desenvolvido um esforço conjunto para lidar com elas, nem que esse esforço se resuma a irem cada um para seu lado, à procura de outra pessoa para lidar com as suas incompatibilidades.
- Pode permitir discussões mais calmas e racionais. Como o assunto não anda a fermentar durante semanas ou meses, não consegue atingir dimensões desmesuradas. Isso significa que existe uma maior possibilidade de ser discutido calmamente, i.e., cada pessoa tentará demonstrar à outra seu ponto de vista, e não a sua pontaria a arremessar objectos pesados e contundentes.
1.2. Desvantagens
- Não funciona se ambos os elementos do casal explodirem por tudo e por nada. Mas, nesse caso, nenhum método irá funcionar. Ou separam-se, ou aceitam que são assim, e vão passar o resto da vida a ser o casal mais "animado" do seu grupo de amigos.
2. Why can't we all get along?
Neste método, não se discutem os problemas para não criar mau ambiente, na esperança de que as coisas vão ao lugar por si próprias. Eventualmente, é o que acaba por acontecer, mesmo quando isso significa que vai cada um à sua vida, porque aquela relação já deu o que tinha a dar.
Este método pode exemplificar-se pela seguinte interacção:
---
Ele (saindo da casa de banho, após um belo duche, a pingar a casa toda): Ah, soube mesmo bem este banho. Sinto-me outro.
(Ele dirige-se ao frigorífico, retira o frasco de compota de framboesa, no qual mergulha o dedo, sacando um bocado de compota que mete na boca; afasta-se e deixa o frasco em cima da bancada)
Ela (num tom muito terno, apesar de estar a mudar de cor 1,500 vezes por micro-segundo, com toda a cena que acabou de presenciar): Ainda bem, 'mor. Fico muito feliz por estares feliz.
(Ele passa por ela e apalpa-lhe o rabo com a mão molhada, deixando-lhe uma bela mancha húmida nas calças brancas, e uma pequena nódoa de compota de framboesa; ah, e continua a pingar o chão pela casa toda, a caminho do quarto; a frequência de mudança de cor passa para 17,423 vezes por nano-segundo).
---
Mas o importante é que esteja tudo bem. Não vamos agora criar mau ambiente na relação só porque ambas as partes estão sempre a fazer qualquer coisa que o outro não gosta. Não, o importante é darmo-nos bem, e uma relação exige sempre uma certa parte de sacrifício, não é? Se esse sacrifício implica passar dias a fio a aturar atitudes de que não gostamos, então que seja. Afinal, todas estas provas pelas quais vamos passando até nos farão dar mais valor à relação, certo?
Vou abster-me de tecer grandes comentários sobre este método. Digo apenas que, infelizmente, é mais comum do que aquilo que possamos pensar. E acrescento que, quando finalmente uma das partes perder a paciência, em vez de 100 abalos individuais de 0.01 unidades de magnitude, a relação sofrerá um terramoto intenso de 100,000,000 de unidades de magnitude, onde todos os pormenores de todas as situações passadas vão ser atirados à cara de parte a parte, como se de objectos pesados e contundentes se tratassem.
2.1. Vantagens:
- Não sei... se conhecerem alguma, estão à vontade para deixar um comentário.
2.2. Desvantagens
- Tem apenas uma pequena desvantagem... na esmagadora maioria dos casos, não funciona.
- Bem, por acaso, tem uma outra pequena desvantagem... pode funcionar. Isso significa, geralmente, uma de duas situações: a) Um dos elementos do casal faz o que quer e lhe apetece, e o outro anula-se completamente; ou b) ambos fazem o que querem e lhes apetece, mas estão-se de tal forma nas tintas um para o outro que a relação nem sofre com isso, até porque nem sequer existe uma "relação" digna desse nome. Ao que parece, há para aí muita gente que considera qualquer uma destas situações como uma boa base para uma vida em comum.
Por hoje é tudo. Depois apresento-vos o terceiro método, que pensava que seria relativamente raro, mas começo a aperceber-me que, afinal, está mais difundido do que eu pensava.
Um dos pontos mais importantes para assegurar a estabilidade de uma relação é a gestão de conflitos. Afinal, quando tudo corre bem, nada parece correr mal, mas quando alguma coisa corre mal, é sinal que nem tudo corre bem. Sim, eu sei. Eu também fiquei espantado com as minhas geniais capacidades de dedução quando reli esta frase, depois de a escrever. Se eu conseguisse aplicar essas capacidades de dedução ao IRS, seria muito mais... muito mais... enfim, muito mais, que é o que interessa.
Bem, adiante... os conflitos são inevitáveis, mas, dependendo da forma como lidamos com eles, os seus resultados podem ser muito variados. Até agora, tomei contacto com três métodos para levar a cabo esta gestão de conflitos. Hoje apresentarei dois, e no próximo post apresentarei o terceiro.
1. Here & Now
Este método, apesar do nome, não implica que os diferendos sejam discutidos no exacto momento em que surgem. Pode não ser apropriado, p.ex., um casal discutir as suas opiniões divergentes sobre o melhor método de eliminar maus cheiros na casa de banho, durante um almoço de família onde se celebra o 95º aniversário da avó Prudência.
No entanto, este método obriga sempre a que um assunto seja discutido, no máximo, poucos dias depois de ter acontecido. Poderia dizer que é desejável que a discussão seja civilizada, mas o conceito de "civilizado" é tão lato que é melhor nem falar disso.
Direi apenas que este método funciona melhor quando, pelo menos, um dos elementos do casal consegue manter a sua participação na discussão de forma relativamente calma, mesmo que a outra pessoa esteja a começar a atingir tons alarmantes de púrpura, e a partir a colecção de cristais da Boémia apenas com a potência dos seus gritos.
Apesar de este me parecer ser o melhor método, é muito pouco utilizado, e não consigo perceber porquê. Até mesmo eu, que defendo a sua utilização com unhas e dentes, sou culpado de o utilizar de forma inconsistente. Gostava de ter uma resposta brilhante e inovadora para isto. Que raio, já me satisfazia com uma resposta parva e óbvia, desde que fizesse sentido. Se tiverem algo a dizer sobre o assunto, desde que não seja o habitual "as pessoas são assim", feel free to drop me a note.
1.1. Vantagens:
- Dá resultados mais cedo. As incompatibilidades emergem mais rapidamente, e isso permite que seja desenvolvido um esforço conjunto para lidar com elas, nem que esse esforço se resuma a irem cada um para seu lado, à procura de outra pessoa para lidar com as suas incompatibilidades.
- Pode permitir discussões mais calmas e racionais. Como o assunto não anda a fermentar durante semanas ou meses, não consegue atingir dimensões desmesuradas. Isso significa que existe uma maior possibilidade de ser discutido calmamente, i.e., cada pessoa tentará demonstrar à outra seu ponto de vista, e não a sua pontaria a arremessar objectos pesados e contundentes.
1.2. Desvantagens
- Não funciona se ambos os elementos do casal explodirem por tudo e por nada. Mas, nesse caso, nenhum método irá funcionar. Ou separam-se, ou aceitam que são assim, e vão passar o resto da vida a ser o casal mais "animado" do seu grupo de amigos.
2. Why can't we all get along?
Neste método, não se discutem os problemas para não criar mau ambiente, na esperança de que as coisas vão ao lugar por si próprias. Eventualmente, é o que acaba por acontecer, mesmo quando isso significa que vai cada um à sua vida, porque aquela relação já deu o que tinha a dar.
Este método pode exemplificar-se pela seguinte interacção:
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Ele (saindo da casa de banho, após um belo duche, a pingar a casa toda): Ah, soube mesmo bem este banho. Sinto-me outro.
(Ele dirige-se ao frigorífico, retira o frasco de compota de framboesa, no qual mergulha o dedo, sacando um bocado de compota que mete na boca; afasta-se e deixa o frasco em cima da bancada)
Ela (num tom muito terno, apesar de estar a mudar de cor 1,500 vezes por micro-segundo, com toda a cena que acabou de presenciar): Ainda bem, 'mor. Fico muito feliz por estares feliz.
(Ele passa por ela e apalpa-lhe o rabo com a mão molhada, deixando-lhe uma bela mancha húmida nas calças brancas, e uma pequena nódoa de compota de framboesa; ah, e continua a pingar o chão pela casa toda, a caminho do quarto; a frequência de mudança de cor passa para 17,423 vezes por nano-segundo).
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Mas o importante é que esteja tudo bem. Não vamos agora criar mau ambiente na relação só porque ambas as partes estão sempre a fazer qualquer coisa que o outro não gosta. Não, o importante é darmo-nos bem, e uma relação exige sempre uma certa parte de sacrifício, não é? Se esse sacrifício implica passar dias a fio a aturar atitudes de que não gostamos, então que seja. Afinal, todas estas provas pelas quais vamos passando até nos farão dar mais valor à relação, certo?
Vou abster-me de tecer grandes comentários sobre este método. Digo apenas que, infelizmente, é mais comum do que aquilo que possamos pensar. E acrescento que, quando finalmente uma das partes perder a paciência, em vez de 100 abalos individuais de 0.01 unidades de magnitude, a relação sofrerá um terramoto intenso de 100,000,000 de unidades de magnitude, onde todos os pormenores de todas as situações passadas vão ser atirados à cara de parte a parte, como se de objectos pesados e contundentes se tratassem.
2.1. Vantagens:
- Não sei... se conhecerem alguma, estão à vontade para deixar um comentário.
2.2. Desvantagens
- Tem apenas uma pequena desvantagem... na esmagadora maioria dos casos, não funciona.
- Bem, por acaso, tem uma outra pequena desvantagem... pode funcionar. Isso significa, geralmente, uma de duas situações: a) Um dos elementos do casal faz o que quer e lhe apetece, e o outro anula-se completamente; ou b) ambos fazem o que querem e lhes apetece, mas estão-se de tal forma nas tintas um para o outro que a relação nem sofre com isso, até porque nem sequer existe uma "relação" digna desse nome. Ao que parece, há para aí muita gente que considera qualquer uma destas situações como uma boa base para uma vida em comum.
Por hoje é tudo. Depois apresento-vos o terceiro método, que pensava que seria relativamente raro, mas começo a aperceber-me que, afinal, está mais difundido do que eu pensava.
4 Comments:
Sinceramente... é tudo tão, tão relativo que podemos dissertar várias horas sobre o assunto e termos todos variadissimas opiniões que, será sempre tudo relativo e baseado nas experiências pessoais, que poderão não se repetir com outra pessoa.
Nem sei que diga, olha boa noite e um dia feliz sem necessidade de recorrer a estas metodologias :)
:)
Isso não se faz: deixar a malta suspensa pela terceira. Fiquei curiosa... há uma terceira??
Eu opto sempre por falar na hora e no momento; detesto ter de guardar alguma coisa porque sei que a longo prazo não resulta na assimilação mas sim na indigestão do conflito.
Partindo do princípio que é uma relação conjugal, claro está.
A gestão de conflitos deveria ter passado já a curso superior, pois existem demasiados conflitos: familiares, profissionais, com os amigos, e até nos dias que correm, com os bloggers ;)
Depois há aqueles conflitos que nem sabemos nem percebemos porque surgem. Nestes últimos anos, tenho vindo a aprender muita coisa sobre este assunto e, sinceramente, há muita coisa que ganhou uma dimensão tremenda, ao passo que passei a não dar importância absolutamente nenhuma a outra tanta.
É a vida... :)
Beijos
Sea,
sim, é possível. Eu só sublinhei estas três, pq são padrões q já vi repetidos n vezes, incl. por mim próprio (bem, no meu caso, à excepção da terceira).
:*
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Obrigado, Nuno :) Um abraço.
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Hallo, A.
Sim, há uma terceira. Qt a deixar a malta em suspense - o pessoal queixava-se q os meus mails eram mt longos, e eu comecei a parti-los em partes, para facilitar a "distribuição" :)
Eu defendo aquilo q dizes, falar no momento, mas admito q nem sempre consigo. E sim, o tipo de relação a q me refiro é maioritariamente a relação conjugal (or a reasonable fac-simile).
Qt à gestão de conflitos num sentido mais lato, e a inexplicabilidade (yes, I looked it up - it exists :) ) dos mesmos, creio q um dos problemas está justamente qd essa "escala de importância" de cd um é incompatível.
Qt aos conflitos com os bloggers, já me apercebi q "Sth is in the air", mas ainda n percebi o q. De qq forma, n é de surpreender - a blogoesfera é uma extensão da VR, com td o q esta possui, e n uma dimensão mágica where we all get along.
:*
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