domingo, maio 28, 2006

Conspirações

Entre os assuntos que me fascinam, encontra-se a guerra, em particular a WWII. Uma amiga minha ficou chocada quando eu lhe disse isto, mas é verdade.

O assunto fascina-me por três motivos
- Por ver que o facto de estarem em jogo vidas, centenas ou milhares de vidas, não muda em nada a atitude da maioria das pessoas, que continuam a cometer erros crassos, baseados apenas na teimosia ou na mesquinhez.

P.ex., na altura do desembarque na Normandia, Hitler tinha uma reserva de Panzers pronta para entrar em acção. Se isto tivesse acontecido, os alemães poderiam ter inviabilizado o avanço dos Aliados. Mas Hitler não o fez em tempo útil, por considerar que a invasão era uma manobra de diversão.

O oficial que comandava as tropas alemãs em França (deveria ser Rommel, mas este tinha ido passar uns dias com a família, na Alemanha) detestava Hitler, e recusou-se a pedir ao "cabozinho nojento" (não foi esta a expressão, mas era este o sentimento) que mandasse avançar esses Panzers.

- Por me aperceber da importância que o acaso (ou sorte, ou azar, ou whatever) tem em tudo. Afinal, se hoje não andamos todos a falar alemão, devemo-lo à coragem e ao sacrifício de muita gente, mas também a uma série de acasos.

P.ex., a guerra só não acabou mais cedo porque alguém tinha os pés grandes :) Em 44/45 houve um atentado contra Hitler. A ideia era simples, e foi planeada por um conjunto de generais. Os seus motivos eram, também, simples. Eram militares, faziam o que lhes mandavam, mas tinham inteligência suficiente para ver que a guerra estava perdida, e que deveriam tentar negociar um armistício enquanto ainda estavam em condições de o fazer.

Quanto aos pés grandes... deixaram uma mala com explosivos encostada a uma coluna, numa sala onde Hitler ia ter uma reunião. Supostamente, um dos oficiais presentes, devido ao sítio onde estava, bateu com o pé algumas vezes nessa mala, e decidiu colocá-la do outro lado da coluna. Desta forma, a coluna ficou entre Hitler e a bomba. Quando este rebentou, a coluna protegeu o ditador do impacto, salvando-lhe a vida. São as coisas do Destino.

- Por ver que, com o passar dos anos, nem tudo o que parece, foi.

Relativamente a este último ponto, vi este Sábado, no Canal História, um documentário em duas partes sobre um conjunto de situações que continuam por esclarecer relativamente à morte de Mussolini. Nem tudo o que ali se dizia estava provado a 100%, mas havia indícios suficientes para o Canal História exibir o documentário.

Os personagens centrais do documentário eram um ex-agente secreto dos USA, um ex-membro da resistência italiana, que foi supostamente quem executou Mussolini, e uma italiana, suposta testemunha dos acontecimentos.

Apresentemos, então, os factos.

1. Churchill contactou Mussolini por carta, e ambos mantiveram correspondência entre 1940 e 1945. Não creio que seja um assunto consensual, mas existem historiadores que não duvidam da autenticidade das primeiras cartas. Nestas, Churchill pedia a Mussolini que mantivesse a neutralidade no conflito entre os Aliados e a Alemanha. Em troca, oferecia-lhe, em nome da Coroa Britânica, um conjunto de territórios na Europa e em África. O busílis da questão é que a maioria desses territórios não eram britânicos - a Córsega, a costa jugoslava, territórios franceses em África, etc.

2. A certa altura, Churchill pede a Mussolini que se junte à Alemenha, declarando guerra aos Aliados. Facto não comprovado. O objectivo declarado seria que Mussolini pudesse ter uma influência pró-britânica sobre Hitler. Hitler que, nesta altura, ainda via o ditador italiano como um ídolo.

3. Mussolini tinha interesse em manter este jogo, pois não tinha confiança numa vitória alemã. Tanto quanto sei, facto não comprovado.

4. Quando a sorte da guerra começou a virar, Churchill alterou as propostas, que ficaram muito menos generosas, e a sua preocupação principal passou a centrar-se na devolução da correspondência que Mussolini tinha em seu poder. Facto não comprovado.

5. Mussolini passou à máquina essa correspondência, fazendo várias cópias da mesma, e entregou-as a um conjunto de pessoas de confiança. Facto não comprovado. Vários elementos (italianos e americanos) declararam que viram essas pastas, e confirmaram a existência de correspondência entre Mussolini e Churchill.

6. Já na fase final da WWII, após o desembarque Aliado em Itália, Churchill propôs a Mussolini uma aliança para travar o avanço dos soviéticos na Europa. Supostamente, essa ideia caiu por terra porque os soviéticos ganharam terreno demasiado depressa para que isto pudesse ter algum efeito prático. Facto não comprovado. A sua credibilidade advém do facto de Churchill abominar, de corpo e alma, o Comunismo.

7. Mussolini e a sua amante não foram executados pela facção comunista da Resistência, na tarde de 28 de Abril de 1945. Foram mortos na manhã desse dia, por uma brigada não-comunista da Resistência, coordenada por um agente inglês. Facto não comprovado. No documentário, o homem que executou Mussolini conta como tudo aconteceu e a testemunha italiana que vivia ali perto confirma a hora dos disparos. O agente inglês executou a amante de Mussolini, por esta saber demasiado sobre a correspondência, e não escondeu o facto de que andava à procura de documentos importantíssimos. Segundo vários membros da Resistência, na altura da queda das forças alemãs no Norte da Itália, apareceram junto da Resistência italiana inúmeros agentes ingleses, todos muito preocupados com os documentos de Mussolini. Outro aspecto a considerar é o facto de, nos anos que se seguiram aparecerem, pelo menos, três relatos oficiais da execução de Mussolini com pormenores diferentes. Além disso, elementos da Resistência comunista comentaram que os cadáveres de Mussolini e da amante não tinham qualquer sangue, e estavam rígidos, ao contrário dos cadáveres dos Ministros do ditador, que haviam sido executados na "mesma altura".

8. O agente inglês tirou várias fotos do casal morto, bem como dos membros da Resistência que estavam presentes. Facto não comprovado. No documentário, o americano e o italiano acusam os ingleses de possuirem essas fotos. Segundo o italiano, o compromisso britânico era que as mesmas lhe seriam entregues em 1995 (50 anos após os acontecimentos), mas até hoje, nada. O americano afirma ter utilizado alguns contactos dentro dos serviços secretos britânicos, mas que estes, sem negarem a existência das fotos, disseram-lhe que "nada podiam fazer".

9. Nos meses que se seguiram à morte de Mussolini, diversos elementos da Resistência que tinham estado mais em contacto com esta questão foram morrendo. Facto comprovado.

10. Nos anos que se seguiram, Churchill foi diversas vezes passar férias à região italiana dos Grandes Lagos, na fronteira com a Suiça, onde Mussolini foi morto. Facto comprovado.

11. Durante essas visitas, havia uma actividade acrescida de agentes ingleses na região, à procura dos documentos. Facto não comprovado. No documentário, menciona-se, pelo menos, uma ocorrência em que um arquivo é assaltado, mas os assaltantes não tocam em nada do que seria mais normal - dinheiro, objectos de valor, etc. A sua atenção concentrou-se apenas nos documentos.

12. Até ao início da década de 50, continuaram a morrer pessoas que haviam estado ligadas a estes acontecimentos. Facto comprovado.

Já não me recordo da data exacta, mas ou foi em final dos 50s ou algures nos 60s que apareceram em público as primeiras cópias das cartas, que foram publicadas em várias revistas. Não deixa de ser curioso que, sendo um assunto relativavmente controverso, e publicado há mais de 30 anos, eu nunca tenha ouvido falar dele, mas pode ter sido falta de atenção da minha parte.

É por isto que estas histórias me fascinam. São teorias da conspiração, mas como todas as boas teorias, são credíveis. Não me espanta nada que houvesse realmente muita gente a morrer apenas para preservar a credibilidade política de Churchill.

Há mais histórias como esta. P. ex., quando os alemães invadiram a URSS, encontraram valas comuns nas partes da Polónia que tinham estado sob ocupação soviética. Anunciaram o facto com pompa e circunstância, atribuindo o massacre aos soviéticos (dava-lhes jeito, pois os polacos eram o elo de ligação nas negociações anglo-soviéticas), e até permitiram o acesso de repórteres neutros e de autoridades polacas ao local. Quando os soviéticos recuperaram esses territórios, mudaram a versão dos acontecimentos - afinal, aquelas valas comuns haviam sido resultado da acção alemã. Curiosamente, os soviéticos não permitiram a ninguém o acesso ao local, para examinar as "novas provas" que os haviam feito chegar a esta conclusão.

Um dos polacos que recebeu as provas apresentadas pelos alemães estava em Inglaterra, e era o líder do grupo de polacos que andava a ajudar nas negociações entre Estaline e Churchill. Este polaco ficou completamente convencido da veracidade das acusações alemãs, e anunciou a Churchill que não iria continuar a participar nestas negociações, e que iria aconselhar os restantes polacos a tomarem uma atitude semelhante. Este indivíduo morreu repentinamente, passados uns dias, e foi substituído na liderança por outro, menos dado a acreditar nas provas alemãs.

Há alguns anos, já com Putin na presidência, os russos realizaram uma investigação, a pedido dos governo polaco. Essa investigação produziu várias dezenas de dossiers. Apesar de esses dossiers se referirem a eventos passados há mais de 50 anos, foram considerados como confidenciais, não foram entregues ao governo polaco, e a versão oficial dos russos mantém-se - o massacre foi efectuado pelos alemães.

E o mais irónico é a forma como a credibilidade destas teorias é reforçada pela reacção dos visados.

4 Comments:

Blogger homempasmado said...

A História também me fascina.
É uma pena a disciplina ser ensinada de forma tão sensaborona nas nossas escolas!

:-(

17:41  
Blogger Llyrnion said...

Plenamente de acordo.

Se houvesse mais gente a ensinar História como o prof. JH Saraiva...

22:53  
Blogger Patrícia said...

Eeeeei! Eu gosto dele!

23:12  
Blogger Llyrnion said...

Eu tb. Por isso achar q seria algo positivo ter mais professores como ele.

Sorry, fui demasiado subtil, não fui? :D

:*

00:41  

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